terça-feira, 25 de agosto de 2009

Sobras




Às vezes acho que sobra muito de mim
Sobras de um amor qualquer com as mãos postas sobre o peito nu
Sobras nas latas do passado
O indigesto.
Restos não mastigados.

Acho que me sobra o que não digo
E o que na minha alma se esparsa
Não tem nome...
Não tem nome!
E só eu sei.

Te sei
Criatura marinha!
Algas sobre meus naufrágios...
Essa coisa meio esquecimento meio lembrança
Essa inexatidão de tudo que vive em mim

Que mudo me enlaça!
As sobras que joguei fora
Mas que agora
Devorariam minha alma.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Aqui jaz meu verso.


Este meu verso submerso
Não tem pátria pra seguir
Nem modelo que lhe caia bem
Vem solto e vertiginoso por dentro do meu corpo
Seu desejo é suicida...Jogar-se!
Viver de queimar-se em mim.
Porém quando deitado em papel já não é mais meu.
Vaga num limbo alheio.

Se renascer num coração não sei que forma terá.
Tampouco me importa se o amarem ou não.

Já cumprimos nossa sina.
Vamos em paz.

Amém.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Rua



A rua é paradeiro
Parapeito de prédio
Esquina de puta
É para o efeito do tédio a sua despedida

A rua é o sujeito perfeito na noite vazia
Um olhar caçado a caça de companhia.

Rompendo em bares a rua é fria
Um cão ladrando para cara da burguesia
Caindo sobre os passos da cotidiana melodia

Emboscada




O teu olhar pequeno
Espelho fez do meu
Que é todo nele adeus
Sabei porem agora que agora é todo teu
E esta lagrima que escorrega
Fria
Suja
Cega
Sabe apenas do que não quer
E implora pra que te vá
Seguires o que bem quiser

Vestígios



Vestígios teus invadem minha carne…
Enjoam minha fome

A cidade tem mulheres às pencas
Mulheres que me deixariam saciado de afetos
Mas todas as putas mulheres têm os teus vestígios

Umas me ignoram tua face
Outras me escancaram teus sorrisos
E ah as que covardemente
Culpam-me por trazer -te comigo

Confissão na noite fria



Noites e noites passadas dentro de meu áspero mundo só
Não consigo ver para além dos muros dos dias vindouros
Tudo dentro de mim é um fim de tarde querendo anoitecer
Tenho o amor que pedi e minha casa pra cuidar
Tenho amigos para dividir e mulheres para me saciar
Mas nas noites ásperas nada me vale, sou toda minha e só.
Lá fora o tempo e o mundo são solidões imensas para os meus pés voadores
A madrugada é fria. Eu, entre os cobertores, desnuda choro um mundo mentiroso e senil.
E no meu medo do imenso me agarro as minhas juras de não vender amores a este mundo vil

Amor de bonecas




Eu cresci numa rua onde a maioria das crianças eram meninos. Fora eu só tinha mais duas que, diferente de mim, (que era um piá) eram cheias de fricotes e lacinhos.
Enquanto eu corria suada com meus amigos pela rua, uma ia à casa da outra e saia de lá à tardinha, buscada pela mãe.
Não, eu não falava com elas. Éramos simplesmente de mundos opostos e nada nos fazia crer que uma comunicação entre nós fosse possível.
Mas acontece que um dia, observando a rotina delas de entrar em casa e só sair à hora marcada, comecei a me sentir atiçada pela curiosidade.
Toda vez que elas se encontravam para entrar em casa eu dava um jeito de espiar ou tentar ouvir se elas falavam de algo que poderia ser a brincadeira que lhes tomaria aquele tempo, trancadas em casa. Elas logo perceberam meu interesse, pois também agora me olhavam enviesadas. Começamos a trocar comunicação visual. Elas me olhavam com um “-o que foi?” E eu encabulava, desviava os olhos e não contava o que me acometia.
Certo dia porem, elas ousaram mais. Estava eu a beber meu Nescau quando elas me chamaram ao portão de casa.
-Oi
-Oi
-Como é teu nome?
-Gabi…
Daí então papo vai, papo vem…
-Quer brincar lá em casa?
O mistério seria desfeito!
-Sim, quero.
Entramos. A casa era grande, o chão era lustroso e exalava cheiro de alfazemas, o quarto todo em rosa e branco com retratos da menina nas paredes, do lado da cama, caídas no chão, estavam três bonecas barbies, junto com algumas roupinhas e outros tantos brinquedos da mesma coleção. Era isso então?! Peguei uma das bonecas e fiquei em silêncio com ela nas mãos. Foi à primeira vez que tive uma assim. Nossa, era uma replica perfeita de uma mulher adulta! Passei a mão nos seios ondulados de borracha macia. Olhei rápido para baixo e…Não o sexo era como o dos anjos, não tinha.A bunda era de verdade, assim como os seios.
-Olha, pode brincar com essa.
A minha boneca emprestada, claro que era a mais usada também. Tinha uns cabelos picados (quem sabe algum irmão maldoso) pensei, a cabeça meio torta para um lado. Peguei uma canetinha e pintei uma estrela vermelha bem no rosto, antes que elas se espantassem com meu feito, declarei:
-A minha é a rocker!
Elas pareceram entender, pois brincamos felizes e absortas a tarde toda. E no outro dia e depois e depois eu só quis saber das meninas por um bom tempo.
Meus irmãos indignados com minha falta nas brincadeiras de rua me faziam piadas.
-Ai que chato ficar brincando de bonequinhas.
Eu não dava bola. Minha mãe adorou a idéia! Era convidada agora para a roda de chimarrão das mães das minhas novas amigas. Enquanto brincávamos no quarto elas tagarelavam na sala, sobre os filhos os maridos, enfim…Estávamos todas femininas e felizes.
Só que um dia entendi que só eu é que não era dona de uma das bonecas. Eu não podia levar a minha pra casa, brincar com ela sozinha, criar roupinhas novas nem me interessava já que a boneca não me pertencia.
Andava triste, remoendo minha não posse de algo desejado pela casa. Resolvi então confessar para minha mãe e lhe pedir que também me desse uma Barbie. Ela disse que ia ver, apressada para ir para o trabalho.
Dias e dias e nada da minha mãe me dar a Barbie.
Pobre de minha mãe, hoje penso, trabalhava até tarde em um mercado de caixa, a grana mal dava para pagar as contas e também se me desse um presente sem ter data especial meus irmão reclamariam certamente. Mas eu não entendia assim na época, é difícil para uma criança entender tudo que se encontra entre a vontade e o presente. Apenas sentia que não deveria choramingar se ela não me dava. Mas esperava.
Um dia, já quase perdendo a esperança de ganhar, eu sentada olhando desenho, ela chega com uma caixa.
-Já vale pelo teu aniversario, ta?
-Ta mãe!
Rasguei a caixa sedenta em ver minha boneca e…Surpresa! Era um boneco, um Ken e nem era original, era falsificado do Paraguai, tinha uma roupa de toureiro com camisa branca engomada, calça preta de cintura alta, com capa e tudo.
-Filha o camelô não tinha boneca, mas disse que esse era o namorado da Barbie.
Resignei-me. Não era de todo mal a final.
E no outro dia, as meninas felizes, disputaram-me entre tapas para que eu namorasse suas bonecas.

Vem mãe




Existia um segredo sobre aquela mulher
Eu logo percebi nos seus olhos este ardor de mundo fosco
Ela pousava mariposas nos cabelos soltos
E se vestia vespertina pela casa em sono

Tinha nos braços uma brancura de coisa santa
Algo de se querer enleios e não temer a morte
Nos ombros magros a pele lustrada e firme

Ninguém saberá quantos massacres aquela mulher suportou!
Nem quantos silêncios lhe engoliam a voz quando falava!

Quis voar sem dizer me
E doeu seu vôo para longe dos meus anseios.

Ai, quem saberá a dor do teu nome se não eu?
Na garganta engasgada com ganas de gritar…
Vem mãe!

Corpo palavra




Quero cantar-te
Prosa
Verso
Verbete
No teu “V” verter-me toda em alfabeto
No “S” dos teus seios silenciar loucos anseios
De amante em verdade.
Quero repartir-nos em meios como silabas
A mor… a mor…E depois quase inaudíveis
Nossos corpos…e n t r e a b e r t o s
Ser o silencio vencido que carregas no profundo do teu incomunicável

Carolina



Carolina, Carolina…
Se eu pudesse te dizer deste meu amor caído nos teus braços
Que eu tenho como fosse pássaro aninhado depois de tanto voar
Como seria bonito poder te mostrar esse amor infinito
Num verso grandessíssimo que não caberia numa só vida e nunca numa A4
Mas ai, Carolina!
Que este amor é daqueles que mora na alma.
Que se declara na vida vivida e nos silêncios das coisas mais profundas

Naufrágio




Na janela sem vidro o frio incontido transpassa.
A palavra se perde na imensidão do nada

Deixei a boca aberta sem grito nem suspiro
Um ar de noite penetrando pela pele
Quem te fez assim Gabriela?! Quem te imaginou nesse silencio?!
Tu que de tão pouco fez teu mundo... E mesmo assim te sufoca.

Agora, sem verso nem mão ela te olha e te indaga.
Essa outra do espelho que te estranha e te pergunta:
-Onde foste?
Por que dentro dos poros, nas veias, latejando.
É que tua vida submersa te leva e afoga
Afoga-te onde antes navegava cheia de esperanças de terras distantes?
Gabriela, teu mar tão azul...
Te traiu.

domingo, 9 de agosto de 2009

Dia de chuva




O que me dói nesse dia de chuva talvez seja inconfessável!

Um desejo de não ser corpo, um querer nunca precisar de nada.
Um sofrer minha impotência em ver sem ter força

O que me dói neste dia de chuva...

É saber que ali fora eles vão estar no frio, é saber que eu tenho um quarto...
Mas, um quarto onde não me caibo, onde meu sono não se cabe
Onde meu medo escorre as paredes úmidas.

O que me dói nessa chuva toda...

São todos os amigos que tirei da minha vida, a minha solidão de auto-penitencia
O grito no escuro de mim

A traição da carne, o medo de um dia não querer mais ver nada
Ignorar, ignorar só para seguir.

O que cai nessa água toda, o que me dói neste cinza escuro das ruas...
É o que não se lava em mim